sexta-feira, 27 de julho de 2007

O Medo de Decepcionar por Lia Luft





O receio de decepcionar as outras pessoas pode tornar-se um empecilho em nossa vida.

Este medo faz com que cobremos de nós mesmos uma perfeição impossível de ser alcançada.

Porém, o que geralmente não pensamos, é que

a nossa primeira preocupação deveria ser em não decepcionar a nós mesmos.

Quantas vezes acabamos não cumprindo os objetivos que nos havíamos imposto.

Nesse caso, passamos por cima de nossos próprios sentimentos

e deixamos de lado nossos sonhos, como se eles não tivessem importância.

Abrir mão de si e daquilo que deseja em função do marido, dos filhos, do namorado

é uma postura bastante comum para muitas pessoas.

Ao fazerem isso, desvalorizam-se e agem como se os sonhos e os objetivos que cultivam

valessem menos ou pudessem esperar para um dia, quem sabe, serem concretizados.

Visto que o futuro é apenas uma hipótese e que somente o momento presente existe,

devemos refletir seriamente sobre o hábito de protelar

a conquista de nossos anseios mais profundos.

Muitas vezes a vida poderá não nos dar uma segunda chance.

Essa não é, em absoluto, uma postura egoísta ou individualista diante da vida.

Trata-se isso sim, de não nos anularmos em função seja de quem for,

para que um dia não cobremos dos demais a não realização

de nossos sonhos e nossa conseqüente frustração.

Manter sempre presente em nossa mente quais as metas que desejamos alcançar

ou o que necessitamos para sermos felizes, é uma forma eficaz

de não abdicarmos de nossa vida para satisfação dos demais.

É importante encontrar o ponto de equilíbrio entre nossas necessidades

e as daqueles com os quais convivemos, sem termos que sempre abrir mão

ou fazer concessões quanto a nossas próprias escolhas.

Não me lembro em que momento percebi que viver deveria ser

uma permanente reinvenção de nós mesmos para não morrermos soterrados

na poeira da banalidade, embora pareça que ainda estamos vivos.

Para reinventar-se é preciso pensar, isso aprendi muito cedo.

Apalpar, no nevoeiro de quem somos,

algo que pareça uma essência, isso mais ou menos, sou eu.

Isso é o que eu queria ser, acredito ser, quero me tornar ou já fui.

Muita inquietação por baixo das águas do cotidiano.

Mais cômodo seria ficar com o travesseiro sobre a cabeça

e adotar o lema reconfortante:

"Parar para pensar, nem pensar"!

Pensar pede audácia, pois refletir é transgredir a ordem do superficial que nos pressiona tanto,

mas pensar não é apenas a ameaça de enfrentar a alma no espelho,

é sair para as varandas de si mesmo e olhar em torno, e quem sabe finalmente respirar e

compreender que somos inquilinos de algo bem maior do que o nosso pequeno segredo individual.

É o poderoso ciclo da existência.

Nele todos os desastres e toda a beleza têm significado como fases de um processo.

Se nos escondermos num canto escuro abafando nossos questionamentos,

não escutaremos o rumor do vento nas árvores do mundo.

Nem compreenderemos que o prato das inevitáveis perdas

pode pesar menos do que o dos possíveis ganhos.

Os ganhos ou os danos dependem da perspectiva e possibilidades de quem vai tecendo a sua história.

O mundo em si não tem sentido sem o nosso olhar que lhe atribui identidade,

Sem o nosso pensamento que lhe confere alguma ordem.

Viver, como talvez morrer, é recriar-se:

A vida não está aí apenas para ser suportada nem vivida, mas elaborada.

Eventualmente reprogramada, conscientemente executada, muitas vezes, ousada !

Questionar o que nos é imposto, sem rebeldias insensatas, mas sem demasiada sensatez.



Saborear o bom, mas aqui e ali enfrentar o ruim.

Suportar sem se submeter, aceitar sem se humilhar,

Entregar-se sem renunciar a si mesmo e à possível dignidade.

Sonhar, porque se desistimos disso, apaga-se a última claridade e nada mais valerá a pena.

Escapar, na liberdade do pensamento, desse espírito de manada

que trabalha obstinadamente para nos enquadrar, seja lá no que for.



E que o mínimo que a gente faça seja, a cada momento,

seja o melhor que afinal se conseguiu fazer.

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